22.6.15

Fernando Assis Pacheco (Elegia)





ELEGIA



Já não me lembra bem o pide Catarino
nem já chove como chovia nas manhãs da minha rua
nem haverá talvez cinco leitores o que se chama interessados
na vida que eu levava: um erro e um desperdício

eram tantas as mulheres enganando os meus passos
tão inclemente o estudo dos poetas antigos
que pensei concorrer à função pública
onde estaria de todos esses males ao abrigo

com 40 mil habitantes no melhor dos casos
a cidade tinha um ar modesto e a puxar para o triste
sempre os mesmos cães magros sempre a mesma gente lenta
o mesmo nevoeiro subindo em espiral do rio

nesse tempo ainda os meus pais eram da família
que depois perdi em anos consecutivos
e eu julgava-os imortais como deuses de luz clara
brilhando à mesa sobre a grande toalha de linho

nem tão-pouco pretendo aborrecer agora os meus filhos
com histórias dessa que enterrada está Coimbra
nós vamos no oco da onda ébrios de sal mordente
o que vem dar à praia é espuma fria e olvido


Fernando Assis Pacheco

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