18.11.10
Alberto de Serpa (Interior)
INTERIOR
Uma névoa densa do fumo dos cigarros.
As carambolas regulares no bilhar de pano desbotado e gasto.
O bater do dominó nos mármores fendidos.
O tinir dos copos esvaziados sem prazer.
Um fado, mais reles pelo cansaço do rádio,
pára nos ouvidos e não chega às almas...
O Senhor Conde arruinado conta as suas aventuras de Lisboa
numa voz arrastada de velhice e saudade,
uma luz a brilhar no fundo dos olhos mortiços...
Nas caras espantadas dos moços atentos
há um rubor de sentidos excitados...
Um schiu, às vezes, impaciente e áspero...
A um canto, onde se vão juntar todas as sombras,
um homem olha em frente, alheado, sem ver...
Um copo em meio, esquecido...
Os olhos fecham-se, feridos pelo fumo, pela luz,
e os corpos encolhem-se friorentos, cansados...
Alberto de Serpa
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