6.1.10

Jaime Sabines (Algo sobre a morte do velho Sabines-II)







ALGO SOBRE A MORTE DO VELHO SABINES


(Primeira parte)


I


Deixa-me repousar,
afrouxar os músculos do coração
e adormecer a alma
para poder falar,
para recordar estes dias,
os mais compridos de sempre.


Mal convalescemos da angústia
e estamos fracos, assustadiços,
a acordar duas e três vezes do nosso sono escasso
para te ver de noite e saber que respiras.
Precisamos de despertar para ficar mais despertos
neste pesadelo cheio de pessoas e de ruídos.


Tu és o tronco invulnerável e nós os ramos,
daí este golpe que nos sacode.
Nunca perante a tua morte parámos
a pensar na morte
nem jamais te vimos senão como a força e a alegria.


Não sabemos bem, mas de repente chega
um aviso incessante,
uma escapada espada da boca de Deus
caindo caindo caindo lentamente.
E então trememos de medo,
afoga-nos o pranto contido,
a garganta apertada pelo medo.
Pomo-nos a andar e não paramos
mais de andar, passada a meia-noite,
nesse corredor do hospital silencioso
onde há uma enfermeira desperta como anjo.
Esperar que morresses era morrer devagar,
como gotejar do tubo da morte,
morrer pouco a pouco, aos bocados.


Não houve horas mais longas do que quando não dormias,
nem túnel mais espesso de horror e miséria
que o que enchiam teus lamentos,
teu pobre corpo ferido.


Jaime Sabines


(Trad. A.M.)


[Original]

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