PRIMEIRAS MORADAS (14)
a arte do retrato, a natureza das palavras
o corpo, que as ficções habitam
como um recinto mal iluminado, aberto
sobre a noite de luzes rectilíneas, longe,
descrevendo o silêncio e, dentro do silêncio,
a sem memória súbita de nunca;
o sentimento penetrável, embrulhado
em algumas imagens, receio, sempre as mesmas,
uma estrada, uma estrela, as arestas do frio,
a vulgar aventura de uma esquina, quando
o infinito pudor os descobre, despidos
de qualquer comoção ou despedida,
minuciosos são os mapas, terras
onde jamais viajas, entregue a essas
razões inúteis que te deste,
a gelatina branca das palavras, o retrato
mal concebido de um ser extraterrestre,
a brandura de nada ter sentido.
António Franco Alexandre
[
Luz & sombra]
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