2.12.11

Fialho de Almeida (Ao despertar)






Agora no Verão é já dia às três e meia.

Sobre as cristas da serra o céu engasta a sua cúpula num aro de cambiantes metalúrgicos cor de fogo a nascente, cor de névoa ao poente, rosa e lilás nos outros pontos.

A primeira andorinha singrou nos ares, soando o angelus que as cotovias há muito, no restolho, bendizendo estiveram em casquinadas joviais.

Um ventinho traz dos campos o cheiro das espigas esmagadas nas eiras, e arrasta sobre as vinhas o refrigerante orvalho da brandura, que amadurece os figos lampos, e ao mesmo tempo engurgita os cachos, entre a decoração dos pâmpanos, festiva e rubenesca.

Esta neblina parece que vem por entre as fendas da cordilheira, lentamente, como um fumo de sulfatara sucessivamente aspirado do fundo duma cratera, para espargir-se, alma benigna da cultura, sobre os vergéis estancados por tantas horas de siroco.

Pouco a pouco o dia ascende, com uma graça paradisíaca, na vitalidade ainda preguiçosa das coisas.


- FIALHO DE ALMEIDA, O País das Uvas (Ao sol > Ao despertar).

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