20.4.16

Alexandre Pinheiro Torres (Paixão-2)





Há quem afirme, muito a sério, que todas as paixões são infelizes.

Não nos levam elas, às vezes, ao mais absoluto descontrolo?

Mas se não fosse todo esse sofrimento não cairíamos para sempre na mais abjecta das preguiças?

Ora Deus ou a Natureza não criaram o homem só para dormir, embora dormir, como disse Nietzsche, não seja arte que se despreze.

Por que não dizer que toda a paixão é o milagre que nos dá perfil humano?

Porque os animais não sofrem de paixões no mesmo sentido que nós.

Expliquemos: os animais não têm corpos, são corpos.

Qualquer acto desses corpos é uma expressão, sem ambivalência, da natureza do animal.

Num certo sentido o animal não tem existência independente.

O homem vive.

O animal é vida.

Se formos pequenos é porque as nossas paixões não são grandes.

Soframos, pois. (n. 67)



ALEXANDRE PINHEIRO TORRES
Espingardas e Música Clássica
(1987)

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