26.10.10

José Rentes de Carvalho (O dedo de Deus)






Os moradores abandonaram as casas anos atrás, quando a lavoura deixou de compensar.

Tirante a quinta das Arcas a meia encosta, também já despovoada, mas onde por enquanto ainda tratam das oliveiras e dos amendoais, o que eu conheci como searas são hoje matos.

Nos meus tempos de criança a brisa fazia ondular num ritmo hipnótico as ladeiras plantadas de cereal, e não era preciso muita fantasia para imaginar um dedo gigantesco a passar e repassar sobre elas, dando-lhes vida.

O dedo de Deus.

Agora, mais bastos que no passado, os pinheiros estendem-se à toa pelos montes.

Vistas de longe, as suas copas parecem um tapete verde lançado sobre a terra estéril, onde os silvedos, as giestas, as estevas, os carrascos e cem outros arbustos daninhos, crescem tão densos que só as fragas maiores não desapareceram ainda sob eles.



- J. RENTES DE CARVALHO, Ernestina, Ed. Escritor, Lx. 2001, p. 11.

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