ELOGIO DA AMADA
Ei-la
que vem ubérrima numerosa escolhida
secreta
cheia de pensamentos isenta de cuidados
Vem
sentada na nova primavera
cercada
de sorrisos no regaço lírios
olhos
feitos de sombra de vento e de momento
alheia a
estes dias que eu nunca consigo
Morde-lhe
o tempo na face as raízes do riso
começa
para além dela a ser longe
A amada
é bem a infância que vem ter comigo
Há
pássaros antigos nos límpidos caminhos
e mortes
como antes nunca mais
Ei-la já
que se estende ampla como uma pátria
no
limiar da nossa indiferença
Os
nossos átrios são para os seus pés solitários
Já todos
nós esquecemos a casa dos pais
ela
enche de dias as nossas mãos vazias
A dor é
nela até que deus começa
eu bem
lhe sinto o calcanhar do amor
Que
importa sermos de uma só manhã e não haver
em volta
árvore
mais açoitada pelos diversos ventos?
Que
importa partirmos num desmoronar de poentes?
Mais
triste mesmo a vida onde outros passarão
multiplicando-lhe
a ausência que importa
se onde
pomos os pés é primavera?
Ruy Belo