20.5.22

Miquel Martí i Pol (Metamorfose-I)





METAMORFOSE-I

 

De tanto em quando a morte e eu somos um,
comemos o pão da mesma fatia,
bebemos o vinho do mesmo copo
e partilhamos amigavelmente as horas
sem dizer nada, a ler o mesmo livro.

De tanto em quando a morte, a minha morte,
faz-se-me presente quando estou sozinho em casa.
Então falamos tranquilamente
do que vai pelo mundo e das moças
que já não pode haver. Tranquilamente,
falamos a morte e eu destas coisas.

De tanto em quando, só de tanto em quando,
é a morte quem escreve meus poemas,
e quem mos lê, comigo a fazer de morto,
a escutar em silêncio, tal como eu quero
que a morte escute quando for eu a ler.

De tanto em quando a morte e eu somos um,
a minha morte e eu somos um, e o tempo
desfolha-se lentamente e compartimo-lo,
a morte e eu, sem relutância,
dignamente, diríamos, para nos entendermos.

Depois as coisas voltam ao sítio
e cada qual retoma seu caminho.

 

Miquel Martí i Pol

 (Trad. A.M./ sobre versão cast. Joan B. Fort i Olivella)


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