15.2.10

Ferreira Gullar (Manhã de sol)






MANHÃ DE SOL




Vianinha, Paulinho, Armando Costa
que dia lindo, não?
Estou passando de carro
ao lado do cemitério São João Batista
e quase escuto vocês aí dentro
falando e rindo
debaixo desse sol.


Deve ser bom estar assim entre amigos
livres das aporrinhações da vida
a olhar as nuvens
e os passarinhos
que por aí
passarinham.


Invisíveis,
de que falam vocês
recostados no túmulo de Vinicius de Moraes?
Do CPC? do Opinião? do futuro
da Nova República?
ou simplesmente flutuam
como os ramos
ao fluxo da brisa?
Paro no sinal da Rua Mena Barreto.
- E pode um marxista admitir
conversa entre defuntos?
Não é a morte o fim de tudo?
- É claro, digo a mim mesmo, é claro –
e sigo em frente.


Mas dentro da minha alegria
os três amigos continuam a conversar e a rir
nesta manhã brasileira
que torna implausível a escura morte.



Ferreira Gullar


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