27.7.14

Raul Brandão (Caminha)





Caminha esta manhã é um sonho doirado que – tenho medo – se vai esvair na atmosfera.

O rio azul, o grande monte fronteiriço, a água, o céu, não têm existência real.

Sobre o esplêndido panorama diáfano e azul, sobre o cone imenso e compacto de Santa Tecla, sobre a povoação de Campozandos, sobre os pinheirais verdes e os campos verdes, sobre a água que não bole, passou agora mesmo um pincel molhado em tinta acabada de fazer.

A vila de ruas lajeadas e a igreja de pedra roída pelo ar salgado, com a Galiza em frente e o fio branco de espuma lá para a barra, parece adormecida e encantada.

Deviam-na deixar morrer intacta, sem lhe deitarem as muralhas abaixo, envolta no doirado que a traz entontecida.


- RAUL BRANDÃO, Os Pescadores.

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