12.1.13
Paulo Moreiras (A guerra civil)
Embora tais sainetes servissem como adubos para temperar aquela caperotada de cains e abéis, a guerra continuava ardilosa e os seus ventos sopravam de todos os lados – e esta andava cerca, cada vez mais próxima.
Todos os dias chegavam notícias dos confrontos entre os absolutistas e os liberais, com vitórias e derrotas para ambos os lados, com avanços e recuos, o que prolongava ainda mais de todos aqueles que viviam à margem das pelejas e dos ideais que se digladiavam nos campos de batalha, pois a sua luta era quotidiana, de manhã à noite, para porem qualquer coisa em cima da mesa e sobreviverem.
Viviam-se tempos calamitosos.
O espectro da miséria pairava em todas as casas e com mais zelo na dos pobres.
Aqueles que tinham algumas courelas de cultivo conseguiam valer-se de umas batatas armazenadas ou comiam beldroegas e agriões apanhados pelos lameiros dos caminhos, que era do pouco que ainda conseguiam encontrar; outros amanhavam-se com couves, bolotas, castanhas ou alguma serôdia cevada.
Quem nada possuía esmolava por um pedaço de broa nos adros das igrejas ou por um caldo de chícharos nos solares mais abastados e dados à caridade e à filantropia.
A míngua era o ar que então se respirava mais amiúde.
PAULO MOREIRAS
O Ouro dos Corcundas
Casa das Letras
(2011)
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