LITERATURA EXPLICATIVA 
O pôr-do-sol em espinho não é o pôr-do-sol 
nem mesmo o pôr-do-sol é bem o pôr-do-sol 
É não morrermos mais é irmos de mãos dadas 
com alguém ou com nós mesmos anos antes 
é lermos leibniz conviver com os medici 
onze quilómetros ao sul de florença 
sobre restos de inquietação visível em bilhetes de eléctrico 
Há quanto tempo se põe o sol em espinho? 
Terão visto este sol os liberais no mar 
ou antero de junto da ermida? 
O sol que aqui se põe onde nasce? A quem 
passamos este sol? Quem se levanta onde nos deitamos? 
O pôr-do-sol em espinho é termos sido felizes 
é sentir como nosso o braço esquerdo 
Ou melhor: é não haver mais nada mais ninguém 
mulheres recortadas nas vidraças 
oliveiras à chuva homens a trabalhar 
coisas todas as coisas deixadas a si mesmas 
Não mais restos de vozes solidão dos vidros 
não mais os homens coisas que pensam coisas sozinhas 
não mais o pôr-do-sol apenas pôr-do-sol 
Ruy Belo
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