9.11.09

Enrique Vila-Matas (Está a ouvir-me, Miss Stein?)









(Está a ouvir-me, Miss Stein?)





Às vezes eu passava, ao entardecer, diante daquela casa da rue de Fleurus e desejava que fazê-lo me desse sorte.

Nunca me deu, pelo menos enquanto eu permaneci em Paris, de maneira que este Agosto, quando fui de novo ver a casa talismã, olhei para a placa comemorativa, pensei em Gertrud Stein e na sorte que não me deu e no medo que eu tinha noutro tempo que o seu espírito descobrisse as minhas modestas ligações com Joyce, e também pensei, ou melhor, recordei os problemas que então eu tinha com a unidade, a harmonia e para já não falarmos com o estilo e com o factor tempo.

E desta vez desabafei, disse em voz muito alta, arriscando-me a ser tomado por louco:

“Miss Stein, a senhora está aí, consegue ouvir-me?

“Olhe, olhe-me bem, sou Heminguay.

“Consegue ver-me?

“Ulisses é bom como o caralho é bom como o caralho é bom como o caralho.

“Está a ouvir-me, Miss Stein?”



- ENRIQUE VILA-MATAS, Paris nunca se acaba, 51.


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