14.9.24

Ángel Manuel Gómez Espada (Poema republicano)




POEMA QUE SALE REPUBLICANO SIN QUERER

 

En un poema, una mariposa siempre hace bonito.
Una manada de nubes desbocadas o un lazo azul también.
Pero hay otras cosas que no.
Que definitivamente no,
no hacen ningún favor al poema.
Como estercolero, alcantarilla, o charco.
Incluso la palabra “rey” ya molesta.
(No digamos ya “reina”).
Los reyes antaño eran campechanos.
Hoy no tanto.

Sin embargo, si fuéramos capaces de tropezar
con una mariposa en un estercolero;
o tuviéramos que descender
a la oscuridad de las alcantarillas
para contemplar un racimo de nubes;
o encontráramos un lazo azul
embarrado en un charco de sangre,
así sí que destilaríamos algo de poesía.

Pero con un rey, nada de nada.
Con un rey no se me ocurre nada
esta tarde de primavera
para arreglar un poema.
Están de capa caída los reyes.
Afean todo lo que tocan.
Incluso los estercoleros.
Incluso las alcantarillas.

(Por supuesto, no seré yo quien proponga
colocar en un poema a un rey
dentro de un charco de sangre.
La educación que he recibido me lo impide.)

 

Ángel Manuel Gómez Espada

[Life vest under your seat]

 

 

Uma borboleta fica sempre bem, num poema,
uma manada de nuvens desbocadas também, ou um laço azul.
Mas há outras coisas que não,
definitivamente não,
não vão lá muito bem com o poema.
Como estrumeira, esgoto, ou charco.
Mesmo a palavra ‘rei’ já incomoda
(‘rainha’, então, nem se fala),
os reis antigamente eram simpáticos,
hoje nem por isso.

Porém, se fossemos capazes
de tropeçar numa estrumeira com uma borboleta;
ou tivéssemos de descer ao escuro dos esgotos
para contemplar um cacho de nuvens;
ou encontrássemos um laço azul
 enlameado num charco de sangue,
aí sim destilaríamos algo de poesia.

Mas com um rei, nada de nada,
com um rei não me ocorre nada
nesta tarde de primavera
para compor um poema.
Os reis estão de capa caída,
desfeiam tudo o que tocam,
mesmo as estrumeiras,
mesmo os esgotos.

(É claro, não serei eu a propor
que se meta um rei num poema
dentro de um charco de sangue.
A minha educação esmerada não permite.)


(Trad. A.M.)

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