29.11.21

Gloria Fuertes (Os pássaros fazem-me ninho)




LOS PÁJAROS ANIDAN EN MIS BRAZOS


Los pájaros anidan en mis brazos,
en mis hombros, detrás de mis rodillas,
entre los senos tengo codornices,
los pájaros se creen que soy un árbol.
Una fuente se creen que soy los cisnes,
bajan y beben todos cuando hablo,
las ovejas me pisan cuando pasan,
y comen en mis dedos los gorriones;
se creen que soy tierra las hormigas
y los hombres se creen que no soy nada.

 

Gloria Fuertes

[Emma Gunst]

 

 

Os pássaros fazem-me ninho nos braços,
nos ombros, por trás dos joelhos,
tenho codornizes nos seios,
os pássaros pensam que sou uma árvore.
Uma fonte, pensam os cisnes,
que descem e bebem quando eu falo,
pisam-me as ovelhas ao passar
e os pardais comem-me na mão;
julgam que sou terra as formigas
e os homens julgam que eu não sou nada.


(Trad. A.M.)

.

28.11.21

Fernando Luis Chivite (Poema da descrença)




POEMA DEL DESCREIMIENTO


                                    Pasados los treinta años,
                                    los seres humanos se hunden en el horror.

                                                                                  Gombrowicz

Ya he cumplido los cuarenta y siete. No soy pues
inocente. Me he hundido en el horror y he aceptado
el mundo (con tristeza lo digo).

Digamos que al final he acabado aceptándolo,
que viene a ser lo mismo que decir que he dejado
de creer.

Y no me queda otro remedio que asumir
que lo que empieza ahora es ya completamente
otra cosa.

La cuestión, en todo caso (si es que hay que hacer
de esto una cuestión),
es averiguar qué.

Suena como un sarcasmo, pero es así.

Y ahí radica precisamente
el desafío:
en descubrir qué demonios puede ser eso
que debería empezar precisamente
ahora.

Después del descreimiento y de la aceptación.
Después del horror.
Y después de todo
lo demás.

 
Fernando Luis Chivite

 

 

Já fiz quarenta e sete, por isso
não sou inocente. Afundei-me no horror
e aceitei o mundo (com tristeza o digo).

Digamos que no final acabei aceitando,
o que vale por dizer que deixei
de crer.

E não me sobra outro remédio que assumir
que o que começa agora é já completamente
outra coisa.

A questão, em todo o caso (se é que podemos
chamar-lhe uma questão),
é a de saber o quê.

Parece a gozar, mas é assim.

E aí radica precisamente
o desafio,
descobrir que raio será isso
que devia começar precisamente agora.

Depois da descrença e da aceitação.
Depois do horror. E depois de tudo o resto.


(Trad. A.M.)

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26.11.21

24.11.21

Ernesto Pérez Vallejo (De falar com a folha em branco)






DE HABLAR CON UN FOLIO EN BLANCO 

 

Jodido diario: 

Hoy también ha pasado de largo,
sigue siendo primavera en sus ojos
y su boca ha vuelto a marchitar
todas las flores del parque. 

Llevaba la camiseta blanca,
ya sabes, la que llevaba puesta aquel sábado
que con la yema de mi dedo índice
yo rocé suavemente su cintura
y tardé en dejar de sonreír
nueve minutos seguidos.
Estuve a quince segundos de batir mi propio récord.
Una pena. 

De largo,
con sus botas negras de besar el asfalto,
enseñándole música a los bordillos de la calle. 

Hay quien piensa que los versos me crecen entre los dedos.
¿ Pero como escribir un puto poema si no me mira? 

Hoy he visto a Ainara,
le está creciendo muy rápido el pelo,
solo tiene un pecho y es tan bonita
que podría prescindir también del otro
y brillaría exactamente igual.
Igual que cuando teníamos quince años
y en el baño de su casa me enseñaba la fuerza
con la que le crecía el vello púbico. 

¿ Como estás? Le he preguntado.
Sigue fumando.
- ¿Sabes el hueco que se te queda en el pecho
cuando el amor de tu vida te abandona para siempre?
Pues esto es igual,
solo que en lugar de abandonarte alguien
lo haces tú misma.
También me ha dicho que ya no sabe llorar,
que ni siquiera "Los puentes de madison"
le han logrado sacar una puta lágrima.
Ella que lloraba hasta cuando se le acababan los cereales. 

Me ha dado verdadera tristeza,
no hay nada peor en el mundo que llorar hacía dentro.

Luego muy despacio se ha ido calle abajo,
dejándome a oscuras en mitad de una calle
que nunca recordará nuestros nombres. 

De largo, jodido diario, de largo,
con esos vaqueros apretados
que consiguen poner en rojo
todos los semáforos del barrio. 

No sabes cuanto me fastidia a veces,
la puntualidad de los autobuses. 

La señorita del tiempo ha dado lluvia para mañana,
imagino a un montón de estúpidos
paraguas en mano y driblando charcos
como si nunca hubieran tenido infancia. 

La mañana que Laura se fue ni siquiera llovía
y tuve yo que poner todas las lágrimas. 

- Lo peor de hacer las maletas,
no son las cosas que tienes que meter
si no todas aquellas que tienes que dejar- 

Y me miró como se miran
a los perros de las tiendas de animales. 

Era un lunes como hoy, como siempre
pero que también como la chica de la camiseta blanca
pasará de largo.

 
Ernesto Pérez Vallejo

[Los lunes que te debo]

 

Chato diário:

Hoje passou também ao largo,
mas nos seus olhos é ainda Primavera
e a boca voltou a fazer murchar
as flores todas do parque.

 Levava a camiseta branca,
aquela que tinha no sábado,
quando eu lhe embarrei
com um dedo na cinta
e fiquei a sorrir nove minutos seguidos.
Por quinze segundos batia o meu próprio recorde.
Uma pena. 

Ao largo,
com as botas negras de beijar o asfalto,
a ensinar música às bermas da rua. 

Há quem pense que os versos me nascem dos dedos.
Mas como fazer a porra de um poema
se ela não olha para mim?

 Vi Ainara hoje,
cresce-lhe muito o cabelo,
tem só um peito, mas é tão linda
que podia até ficar sem o outro
e brilharia na mesma,
tal como quando nós tínhamos quinze anos
e ela me mostrava em casa a força
com que lhe crescia o velo púbico. 

Continua a fumar.
- Como vais? perguntei-lhe.
- Sabes o buraco que te fica no peito
quando o amor da tua vida te abandona para sempre?
Pois isto é o mesmo, só que
em vez de ser alguém a abandonar-te, és tu.
Contou-me também que já não sabe chorar,
que nem "As pontes de Madison"
conseguiram arrancar-lhe uma lágrima,
ela que até chorava por lhe acabar o cerelac.

 O que me deu uma grande tristeza,
porque não há nada pior do que chorar para dentro.

 Depois foi pela rua abaixo, devagarinho,
deixando-me às escuras no meio de uma rua
que nunca mais lembrará os nossos nomes.

 Ao largo, chato diário, ao largo,
com aquelas calças apertadas,
capazes de pôr no vermelho
os semáforos todos do bairro.

Tu não sabes quanto me aborrece, às vezes,
a pontualidade dos autocarros.

 A menina do tempo deu chuva para amanhã,
de modo que já estou a ver uma caterva de estúpidos
de guarda-chuva na mão, a fintarem os charcos da rua
como se nunca tivessem tido infância. 

No dia em que Laura se foi não chovia sequer
e tive que ser eu a fornecer as lágrimas todas:

 - O pior de fazer as malas
não são as coisas que tens de meter,
mas sim as coisas que tens de deixar -

E olhou-me como se olham
os cachorros das lojas de animais. 

Era segunda-feira como hoje,
como sempre, dia também em que a miúda
da camiseta branca há-de passar ao largo.
 

(Trad. A.M.)

 .

23.11.21

Eloy Sánchez Rosillo (Instante)




INSTANTE 

 

¿Cómo no estar conforme precisamente ahora
-e incluso para siempre- con la vida,
cuando el sol de esta tarde fría y azul,
muy bajo ya, se adentra por mi casa
y hasta el fondo penetra sin ningún titubeo
y convierte a su paso cuanto toca
en oro vivo y repentino, en oro
que nada durará, pero que llena
de compasión el mundo para mí en este instante?
 

Eloy Sánchez Rosillo 

[Life vest under your seat]

 

  

Como não me conformar com a vida,
agora, precisamente - e mesmo para sempre -
quando o sol desta tarde fria e azul,
já baixo, me entra pela casa
e penetra até ao fundo sem qualquer hesitação
e converte à passagem tudo o que toca
em ouro vivo e repentino, em ouro
que não durará, mas enche o mundo
de compaixão para mim, neste instante. 

(Trad. A.M.)

 .

21.11.21

Armindo Rodrigues (Entre montados)




ENTRE MONTADOS

 

Entre montados, olivais antigos,
laranjais, vinhas, candentes searas,
hortas frescas com as suas noras,
movem-se homens decididos.
Em tudo o que fazem põem gravidade,
serenidade, cuidado, harmonia.
Ao morrerem, morrem sem terror da morte,
que acham natural como terem nascido.


Armindo Rodrigues

[Ajuda-me a ver]

 

 

>> Citador (3p) / Archive (Um poeta qs esquecido) / Archive (Centenário) / Wikipedia

.

19.11.21

Eduardo Dalter (Tece a aranha)




TEJE LA ARAÑA



Teje la araña su día 
y engulle voraz, 
pacientemente todo 
lo que ya no podrá volar;
y de resultas simula,
teje y simula,
que ama las alturas. 
Es casi una mariposa presa 
de la tela 
de su aracnidad triste. 
     Y murmura
–nadie la escucha–
y reza en las noches
mientras teje.


Eduardo Dalter

 

 

Tece a aranha seu dia
e engole voraz,
pacientemente, tudo
aquilo que não voa;
e por consequência simula,
tece e simula,
que ama as alturas.
Quase borboleta
presa da teia
de sua triste aranhice.
E murmura
- ninguém  a escuta -
e reza de noite
enquanto tece.


(Trad. A.M.)

.

18.11.21

César Cantoni (Parafraseando Fernando Pessoa)




 PARAFRASEANDO A FERNANDO PESSOA

 

Todas las cartas de amor son ridículas, escribió el poeta.
Todos los poemas de amor también son ridículos.
El amor, incluso, es una cosa ridícula.
La gente mata o muere ridículamente por amor.
¿Pero quién que haya amado hasta el ridículo
no vio abrirse a su paso las aguas del Mar Rojo?

César Cantoni

 

 

Todas as cartas de amor são ridículas, disse o poeta.
Todos os poemas de amor são ridículos também.
O amor, mesmo, é uma coisa ridícula.
As pessoas matam ou morrem ridiculamente por amor.
Mas quem é que, tendo amado até ao ridículo,
não viu abrirem-se-lhe à passagem as águas do Mar Vermelho?


(Trad. A.M.)

.

16.11.21

Artur Cruzeiro Seixas (Um cão)




Um cão 
é isto de sermos gente. 

Se temos só duas pernas 
temos em contrapartida 
uma complicação escura 
dentro do peito. 

Qualquer coisa como 
os fundos desconhecidos 
da água 
só conhecidos 
dos náufragos. 

Para matar 
é preciso uma arma 
e para voar 
como búzios 
precisamos papel e lápis 
— e assim viajamos 
dentro de vegetais malas de viagens 
procurando o destino sufocante 
de todas as paragens. 


Artur do Cruzeiro Seixas

 .

14.11.21

Carlos Sahagún (Desembarque)




DESEMBARCO

 

Perdida la ocasión en las batallas,
años después, hombres y niños esperábamos
un desembarco salvador.

Se poblaban las playas de miradas,
los sueños, de navíos.

Pero nadie venía a destruir
la tiranía del silencio.

Nada en el horizonte de color Normandía.

Sólo espuma en la orilla y tierra inhóspita
bajo los pies descalzos, anhelantes
y acobardados.

Carlos Sahagún

 

Perdida a maré nas batalhas,
esperávamos, anos depois, grandes e pequenos,
um desembarque salvador.

Povoavam-se de olhares as praias,
de sonhos, de navios.

Mas ninguém vinha derrubar
a tirania do silêncio.

Nada no horizonte cor Normandia.

Só espuma na beira e terra inóspita
sob os pés descalços, anelantes
e acobardados.


(Trad. A.M.)

 

>>  A media voz  (28p) / Blogpoemas (28p) / U. Chile (13p) / Insula (num. monográfico) / Dialnet (monografia/276pp) / Wikipedia

 .

13.11.21

Batania (A queda)




LA CAÍDA

 

Fue mi historia con ella
como tirarse del décimo
y encontrarse en el aire
con una mujer
que se había lanzado
del noveno:
pensé que nos unía el amor,
pero
solo
nos
unía
la
caída.
 

Batania

 


Foi assim, minha história com ela,
como atirar-me do décimo andar
e encontrar-me no ar
com uma mulher
que se atirasse do nono;
pensei que nos unia o amor,
mas

nos
unia
a
queda.
 

(Trad. A.M.)

 .


11.11.21

António Reis (Não é a tua mão)




Não é a tua mão
filha

que eu levo
na minha mão

é uma raiz

que eu planto
em mim mesmo

 

António Reis

 .

9.11.21

8.11.21

Antonio Pereira (Oração)




ORACIÓN


Señor ya sabes mis cuidados con el butano y los grifos 
todo lo cierro bien pero es difícil desentenderse 
inspecciono la antena
las macetas con tantas criaturas que por debajo pasan 
sufro mucho Señor
y aunque te agradezco no haberme hecho cirujano 
ni conductor del autobús escolar
te pido que un ratito te quedes responsable
que aguantes todo esto mientras voy a un recado 
y cualquier día no vuelvo.
 

Antonio Pereira

  

Senhor bem sabes os meus cuidados com o gás e as torneiras
fecho tudo muito bem mas não é fácil desligar-me
verifico a antena
os vasos com tanta gente que passa por baixo
sofro muito Senhor
e embora te agradeça não me teres feito cirurgião 
nem condutor de carrinha escolar
peço-te que tenhas tino só um bocadinho
e olhes por tudo enquanto eu vou a um recado
e qualquer dia não volto 

(Trad. A.M.)

 .

6.11.21

Egito Gonçalves (Nenhum amor é total)




Nenhum amor é total, 
nenhum amor desenha a latitude
e longitude como linhas ideais;
na massa em fusão
há sempre uma impureza,
todo o amor tem as suas fissuras
a vigiar constantemente.
O dia, raro atinge a sua ponta extrema.
 

Egito Gonçalves

[Canal de poesia]

 .


4.11.21

Antonio Orihuela (O traje novo do imperador)




EL TRAJE NUEVO DEL EMPERADOR

 

Tengo 31 años y estoy cansado.
Todos los sitios me van pareciendo, finalmente,
igual de malos.
Todas las personas, incluso las que me quieren,
insoportables.
No encuentro sentido ni a lo que hago
ni a las cosas que dejo por hacer.
Miro a los demás
con la absoluta certeza de quien ve
no semejantes,
serenos, resignados, envilecidos extraterrestres.
Vuelvo sobre mí
y me siento como si no hubiera otros con los que compartir.
A donde quiera que miro,
la insoportable mentira que anida, germina, rezuma
este tiempo, este país, este modo de vivir
al que llaman
progresista, tolerante, solidario, democrático,
avanzado, europeo, y mejor y mejor
que todos los habidos,
que todos los posibles.
Este modo de vivir
donde falta todo lo nombrado.
Que ha deshecho la clase trabajadora sin una sola bala,
que ha encarcelado las conciencias sin una sola reja,
que me aparta sin una sola porra,
que me excluye sin un hierro candente,
sin siquiera una estrella amarilla en la solapa.
Este tiempo
de trajes nuevos,
de Emperadores.

 
Antonio Orihuela

 

Tenho 31 anos e estou cansado.
Todos os lugares me vão parecendo, por fim,
igualmente maus.
Todas as pessoas, mesmo as que me amam,
insuportáveis.
Não vejo um sentido no que faço
nem no que deixo de fazer.
Olho para os outros
com a absoluta certeza de quem vê
não semelhantes,
serenos, resignados, envilecidos extraterrestres.
Olho para mim
e sinto-me como se não tivesse outros com quem partilhar.
Para onde quer que olhe,
a insuportável mentira que faz ninho, germina, destila
este tempo, este país, este modo de viver
a que chamam
progressista, tolerante, solidário, democrático,
avançado, europeu, e melhor e melhor
que todos os havidos,
que todos os possíveis.
Este modo de viver
onde falta tudo o indicado.
Que desfez a classe trabalhadora sem uma só bala,
que encarcerou as consciências sem uma só grade,
que me afasta sem um só bastão,
que me exclui sem um ferro candente,
sem sequer uma estrela amarela na lapela.
Este tempo
de fatos novos,
de Imperadores.

 
(Trad. A.M,)


 > Outra versão: Canal de poesia (J.M.Magalhães)

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3.11.21

Antonio Machado (A praça tinha uma torre)




La plaza tiene una torre,
la torre tiene un balcón,
el balcón tiene una dama,
la dama una blanca flor.
Ha pasado un caballero
— ¡ quién sabe por qué pasó ! —
y se ha llevado la plaza,
con su torre y su balcón,
con su balcón y su dama
su dama y su blanca flor.


Antonio Machado

 

 

A praça tinha uma torre,
e a torre uma varanda,
a varanda tinha uma dama,
e a dama uma branca flor.
Então veio um cavaleiro
- sabe-se lá porque veio! -
e levou consigo a praça,
com sua torre e varanda,
com a varanda e sua dama,
com a dama e a branca flor.

(Trad. A.M.)

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1.11.21

Carlos de Oliveira (Estalactite)




ESTALACTITE                   

 

(IV)

Localizar
na frágil espessura
do tempo,
que a linguagem
pôs
em vibração
o ponto morto
onde a velocidade
se fractura
e aí
determinar
com exactidão
o foco
do silêncio.

 

Carlos de Oliveira

 .