(Um frasco em cada mão)
Eu preparava-me para descrever agora melhor o gabinete de
Bernardo, e já ensaiava vários ângulos, com movimentos cinematográficos do
olhar, a que não faltava um contrapicado, quando alguém, truz, truz!, bateu à
porta e me estragou os arranjos.
A porta entreabriu-se e espreitou uma cara feminina,
sorridente, a mais não poder.
Eva, a – por assim dizer – namorada de Bernardo,
apresentava-se triunfal com dois boiões, dos de compota, um em cada mão.
O que eu passo agora a contar é inacreditável.
Prossigo a custo, após uma perplexa hesitação.
A vida, não raro, ficciona, devaneia, absurdiza e eu hei-de
conformar-me a ela, mais do que ao famoso pacto de verosimilhança outorgado com
o leitor.
Mas reparem no conteúdo dos frascos para que não digam que
estou a mentir.
Um está vazio, pronto, não conta.
E o outro?
MÁRIO DE CARVALHO
Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto
(1995)
Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto
(1995)
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