8.3.09

Vitorino Nemésio (Caçadores, ainda)






(Caçadores, ainda…)




Fui sempre traseiro em tudo…

Caçador de saudades não é feito para mandar grãos de chumbo ao peito de codornizes.

Meu tio e meu compadre bem me davam o exemplo agachando-se por trás das paredes, de sobrancelha tensa ao rés dos ligadoiros, o cano da espingarda disfarçando o seu gris nas pedras silenciosamente acamadas ao jeito do enfiamento.

Eu lá ia com eles até ao sainte da vila, aos primeiros restolhos ainda muito vigiados pelo passo das carroças de lenha, mais chocalheiras que matracas.

Mas, ao subir da canada, precisamente quando os bandos das calhordas começavam a desenvolver-se no céu como as peças de pano que meu pai rasgava bruscamente à mão, só com uma talhadela de tesoura - dava-me uma quebreira, uma lassidão sem nome.

E, com o passo mais lesto e fofo que meu tio ou meu compadre à saga do esquivo galinheiro, batia em direcção à capoeira doméstica.



- VITORINO NEMÉSIO, Corsário das Ilhas, 1956, Histórias de Mateus Queimado (Um tiro falhado).


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