28.3.08

Miguel Torga (Depois de ceia)


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(Depois da ceia...)
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Depois da ceia, o pessoal, extenuado, esfarrapado e imundo, cabeceava pelos cantos, ainda à espera de mais trabalho.
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Ganho o dia aos cestos, era preciso ganhar a noite no lagar, num chouto que a princípio dava gosto e alegria, e se prolongava numa tortura desesperante.
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O sono parava os nervos e os músculos, e a vontade tinha de protestar, de combater, de movimentar à sobreposse as articulações, mais perras que dobradiças enferrujadas.
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Ás tantas, erguer uma perna tornava-se um sacrifício.
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O resto do corpo quase que desanimava perante a obstinada renúncia daquela parcela amortecida, inerte e pesada na espessura do mosto.
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Mas tudo na vida acaba, e a penitência não fugia à regra.
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Medida no relógio do Jacinto, com rigor de quem pesa oiro, a hora almejada de despegar chegava finalmente.
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E, num automatismo resignado, lá iam procurar na palha forças para o dia seguinte.



- MIGUEL TORGA, Vindima, XXXIV, princípio.
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