(Um trilo de flauta...)
Um trilo de flauta, débil e puro, chegou-lhe então do alto, num prelúdio. Impreciso e tímido, hesitava como se receasse saltar os valeiros.
Que gelo vinha do passado, e que doce calor havia naquela hora! A mãe, seca e convencional; o pai, irrascível e grosseiro; o irmão, desconsolado e bisonho. Neste areal, ela, a crescer desiludida. E de repente o deserto transfigurava-se, e os sentidos descobriam nele, repassada de frescura, uma planície de promissão!
Sem pensar que ia colhê-lo, caminhou hipnotizada ao encontro do som.
Vazio de ternura e amor, o corpo pedia-lhe a sua parte no banquete do mundo; a intimidade duma presença querida, o aconchego dum lar feliz…
Alta e acariciadora, a voz da flauta chamava.
Que gelo vinha do passado, e que doce calor havia naquela hora! A mãe, seca e convencional; o pai, irrascível e grosseiro; o irmão, desconsolado e bisonho. Neste areal, ela, a crescer desiludida. E de repente o deserto transfigurava-se, e os sentidos descobriam nele, repassada de frescura, uma planície de promissão!
Sem pensar que ia colhê-lo, caminhou hipnotizada ao encontro do som.
Vazio de ternura e amor, o corpo pedia-lhe a sua parte no banquete do mundo; a intimidade duma presença querida, o aconchego dum lar feliz…
Alta e acariciadora, a voz da flauta chamava.
- MIGUEL TORGA, Vindima, XIII, in medio.