22.9.09

Roberto Bolaño (Eis algo)








(Os melhores são os homossexuais, mas cuidado...)





Eis algo sobre a honra dos poetas.

Eu tinha dezassete anos e um desejo irreprimível de ser escritor.

Preparei-me.

Mas não fiquei quieto enquanto me preparava, pois compreendi que se assim fizesse jamais triunfaria.

Disciplina e um certo encanto dúctil, essas são as chaves para chegar onde se quer.

Disciplina: escrever todas as manhãs, não menos de seis horas.

Escrever de manhã e corrigir de tarde, à noite ler como um possesso.

Encanto, ou encanto dúctil: visitar os escritores em casa, ou abordá-los nas apresentações de livros e dizer a cada um exactamente aquilo que ele quer ouvir.

Aquilo que ele quer desesperadamente ouvir.

E ter paciência, pois nem sempre funciona.

Há cabrões que te dão uma palmada no ombro e, depois, se te vi não me lembro.

Há cabrões duros e cruéis e mesquinhos.

Mas não são todos assim.

É necessário ter paciência e procurar.

Os melhores são os homossexuais, mas cuidado, é preciso saber em que momento parar, é necessário saber com precisão o que é que se quer, de contrário pode-se acabar enrabado debalde por qualquer mariconço de esquerda.

Com as mulheres acontece três quartas partes das vezes o mesmo: as escritoras espanholas que te podem dar a mão são velhas e feias, e o sacrifício às vezes não vale a pena.

Os melhores são os heterossexuais já entrados nos cinquenta ou no umbral da velhice.

Em qualquer caso, é iniludível cultivar um jardim à sombra dos seus rancores e ressentimentos.

Evidentemente, há que empinar as suas obras completas, citá-los duas ou três vezes em cada conversa, citá-los sem descanso.



- ROBERTO BOLAÑO, Os detectives selvagens, II. Marco António Palacios, Jul. 1994.

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