21.12.25

Pedro Flores (Assim passava)

 



ASÍ PLANCHABA QUE YO LA VI


Cuántos pantalones
hubo de planchar aquella mujer
para que sus hijos tuvieran unos pantalones
que le dejaban los viernes
en el cesto de la ropa por planchar.
Pareciera que las arrugas
de los pantalones que planchaba
le trepaban por los brazos
y se alojaban para siempre en su rostro.
La muerte la encontró planchando
en el cuartito de la radio,
rociando con agua tibia pantalones ajenos
como una sacerdotisa bendiciendo
las piernas de un ejército invisible.
Y ahí debe de estar todavía,
nadie ha abierto la puerta desde entonces.
Ella no pudo acompañar a la muerte.
Le quedaba aún mucha ropa por planchar.

Pedro Flores

 

Quantas calças
aquela mulher teve de passar
para os filhos terem calças
que lhe deixavam à sexta
no cesto da roupa a passar.
Parecia que as gelhas
das calças que passava
lhe trepavam pelos braços
e se lhe alojavam no rosto.
A morte veio encontrá-la a passar
no quartito do rádio,
a borrifar calças alheias com água morna
como uma sacerdotisa a benzer
as pernas de um exército invisível.
E lá deve estar ainda,
ninguém abriu aquela porta desde então.
Ela não pôde acompanhar a morte,
ainda tinha muita roupa para passar.


(Trad. A.M.)

.

20.12.25

Antonio Porchia (Vive-se na esperança)




Se vive con la esperanza de llegar
a ser un recuerdo.


Antonio Porchia



Vive-se na esperança de vir
a ser uma lembrança.


(Trad. A.M.)


.

18.12.25

Andrea Cohen (Sem lua, mas)

 



NO MOON, BUT

 

I Knew it was
the beekeeper

who touched me,
not because she

tasted of honey,
but because she

was unafraid
of being stung.


Andrea Cohen

  

Soube que fora
a apicultora

que me tocara,
não porque ela

soubesse a mel,
mas porque

não tivera medo
de ser picada.


(Trad. FJCC)

.

16.12.25

Antonio Gamoneda (Sinto o crepúsculo)

 



Siento el crepúsculo en mis manos.
Llega a través del laurel enfermo.
Yo no quiero pensar ni ser amado
ni ser feliz ni recordar.

Sólo quiero sentir esta luz en mis manos
y desconocer todos los rostros
y que las canciones dejen de pesar en mi corazón
y que los pájaros pasen ante mis ojos
y yo no advierta que se han ido.

Hay grietas y sombras en paredes blancas
y pronto habrá más grietas y más sombras
y finalmente no habrá paredes blancas.

Es la vejez.
Fluye en mis venas como agua atravesada por gemidos. Van
a cesar todas las preguntas. Un sol tardío
pesa en mis manos inmóviles y a mi quietud
vienen a la vez suavemente, como una sola sustancia,
el pensamiento y su desaparición.

Es la agonía y la serenidad.
Quizá soy transparente y ya estoy solo sin saberlo.
En cualquier caso, ya
la única sabiduría es el olvido.
 

Antonio Gamoneda 

 

Sinto o crepúsculo nas mãos,
chegando através do cravo doente.
E eu não quero pensar, nem ser amado,
nem ser feliz, nem recordar. 

Quero só sentir esta luz nas mãos
e desconhecer os rostos
e que as canções deixem de pesar-me no coração
e os pássaros me passem diante dos olhos
sem eu dar conta de que se foram. 

Há fendas e sombras nas paredes brancas
e breve haverá mais sombras e fendas
até deixar de haver paredes brancas. 

É a velhice.
Corre-me nas veias como água
atravessada por gemidos.
Cessarão as perguntas todas. Um sol tardio
pesa-me nas mãos imóveis, enquanto
o pensamento e a sua negação invadem,
à uma, a minha quietude. 

É a agonia e a serenidade.
Sou talvez transparente e já estou só, sem saber.
Em qualquer caso, há uma só sabedoria,
a do esquecimento.
 

(Trad. A.M.)

.

15.12.25

Antonio Fernández Lera (Viver pior)

 



(48)

 

Viver pior
Sofrer mais
Dizê-lo
Não dizer
 

ANTONIO FERNÁNDEZ LERA
Poemas lentos 
(2012-18)
 

(Trad. A. M.)

.

13.12.25

Amadeu Baptista (Faca)

 



FACA 

 

Vou constituir-te arguida
pelo assassinato dos meus sonhos.
O êxtase consentia-te
juras de amor, mas a verdade 

é que o amor é coisa ilimitada
e tu premeditavas dar-me
ao abandono, mais dia
menos dia. Aberta uma romã 

o mais que se consente
é usufruir dos brilhos que ela dá 
e agradecer ao templo escarlate  

em que nos foi permitido entrar. 
E não este desgosto, esta faca malsã 
que marca a tua ausência na minha pele.
 

Amadeu Baptista 

 .

11.12.25

Antonio Cabrera (Face ao outono)





ANTE EL OTOÑO             



De la luz del otoño
extraigo alguna consecuencia,
un cimiento menor para estas convicciones:
que la vida es más lenta de lo que suponemos,
que su afamado brillo
nos impone la espera de lo bello inmutable
(y es acaso un error, quizá una burla),
que las tardes contienen una fracción de hiel,
que donde haya renuncia habrá milagro…
Cosas que ya sabía.
En la luz del otoño me ha parecido verlas.


Antonio Cabrera

[Futbol de poetas]

  

Da luz do outono
extraio uma certa consequência,
um cimento menor para estas convicções:
que a vida é mais lenta do que nós supomos,
que seu famigerado brilho
impõe-nos a espera do belo imutável
(e é um erro porventura, um logro),
que as tardes contêm uma parte de fel,
que onde haja renúncia haverá milagre...
Coisas que eu já sabia,
na luz do outono pareceu-me que as vi.


(Trad. A.M.)

 

10.12.25

Antonio Deltoro (Uma árvore)





UN ÁRBOL



Un árbol ancho,
donde no cante el pájaro, 
ni las ardillas suban,
ni se esconda inquietud.

Un árbol que vaya ganando calma
como los otros altura y espesor.

Quiero plantar un árbol de silencio
y sentarme a esperar
a que sus frutos caigan.

Antonio Deltoro 

 

Uma árvore grande,
onde não cante o pássaro,
nem subam esquilos,
nem se esconda inquietação.

Uma árvore que vá ganhando calma
como as outras porte e espessura.

Quero plantar uma árvore de silêncio
e sentar-me à espera
que os frutos lhe caiam.


(Trad. A.M.)

.

8.12.25

Alessandro Celani (Por muito que batalhes)




Por muito que batalhes
o ir e o voltar
o juntar e o separar
o estar com e o estar sem
o recordar e o esquecer
hão-de fazer-se de pedra
e as pedras edifício
e quão difícil te será deixar
a vida que pensas que não viveste
(tu estrangeiro nela
e ela não 
em ti)

Alessandro Celani

(Trad. A.M.)

.

6.12.25

Ángel Manuel Gómez Espada (The other side)

 


 

THE OTHER SIDE IS THE SAME SHIT

 

Entonces, dígame.
Estamos de acuerdo en eso, al menos.
Todo lo que usted me reprocha es a lo que aspira.
Forma mi patrimonio parte de sus sueños.
Repítame de nuevo, pues, si es usted tan amable,

En qué nos diferenciamos. 

Eso mismo me había parecido a mí.

Ángel Manuel Gómez Espada 

 

 

Então, diga-me.
Estamos de acordo pelo menos nisso,
o que você me censura é o que ambiciona.
O meu património faz parte dos seus sonhos.
Repita-me lá novamente, portanto, se faz favor,
em que é que nos diferenciamos.

Ah, bem me queria parecer a mim.


(Trad. A.M.)

.

5.12.25

Ángel Guinda (Ser jovem)



SER JOVEM
 

Ser joven
era abrazar la noche en llamas
hasta el amanecer,
tomar las curvas rectas
como quien tiene prisa por llegar a sí mismo.
Ser joven
era atropellar la vida,
un ejercicio de funambulismo.
Estrellarse contra el azul del cielo,
contra el aire, contra la realidad.
A veces, ser joven
era un deseo temerario de envejecer,
como quien echa un pulso al tiempo
y sólo arriesga el instante de una detonación.
Ser joven fue,
y no volverá a serlo nunca más.

Ángel Guinda

[Trianarts]



Ser jovem
era abraçar a noite em chamas
até amanhecer,
tomar as curvas rectas
como quem tem pressa de chegar a si mesmo.
Ser jovem era atropelar a vida,
um exercício de funambulismo.
Estampar-se contra o azul do céu,
contra o vento, contra a realidade.
Às vezes, ser jovem
era um desejo temerário de envelhecer,
como quem toma o pulso ao tempo
e arrisca só o instante de uma detonação.
Ser jovem foi,
não voltará a ser nunca mais.

(Trad. A.M.)

 .

3.12.25

Alexandre Pinheiro Torres (Portugal dentro das cascas)



PORTUGAL DENTRO DAS CASCAS

 

Antes íamos às árvores da cerca além do claustro
tratar das asas que lhes sonhávamos ao corpo
Primeiro a nau   velas altas         uma casa de sobrado
Depois as santas imagens de pau de cerejeira

Era um Portugal imenso que nem cabia nas cascas
a entrar pelos robles e pinhos de Alcácer
Desenhava-se um mapa e era toda uma serra
O rio Tejo adormecia do voo dele e alheio

Foi impossível    um dia  escrever mais nos lenhos
Começavam a soletrar-se bancos ou mesas das tábuas
e às vezes janelas ornadas que depois se via
serem grades de ferro    postigos só de nuvens

A cerca fechou-se            Nem nela havia árvores
com que sonhar velhas coisas:  memórias só que eram
Ficaram as oitavas rimas e Camões nadando
Hoje       Portugal               seu traço             cabe numa acha


Alexandre Pinheiro Torres

.

1.12.25

Alfonso Brezmes (Beatus ille)




BEATUS ILLE 

 

Felices los que se saben felices,
pues los que lo son sin saberlo
son unos desgraciados.
Felices los mediocres,
porque pueden elegir dos caminos.
Felices los que no han leido a Borges,
a Yourcenar o a Cortázar,
ya que pueden hacerlo todavía.
Felices los poetas y los tontos,
porque al menos creen que son felices.
Felices los que tienen bastante,
porque su necesidad no crece
y su tesoro no mengua.
Felices los que buscan la felicidad
en donde no se esconde,
porque su mala vista les reserva
la felicidad de seguir buscando.
  

Alfonso Brezmes 

 

Felizes os que se sabem felizes,
pois os que o são sem saber
são apenas desgraçados.
Felizes os medíocres,
porque podem escolher dois caminhos.
Felizes aqueles que não leram Borges,
Yourcenar ou Cortázar,
já que podem ainda fazê-lo.
Felizes os poetas e os tontos,
porque ao menos crêem ser felizes.
Felizes os que têm o bastante,
pois que sua necessidade não cresce
e o tesouro não lhes mingua.
Felizes os que buscam a felicidade
onde ela não se encontra,
porque a falta de vista lhes reserva
a sorte de continuar buscando.

(Trad. A.M.)

.