21.7.25

Eduardo Moga (Haikus do trem)




HAIKÚS DEL TREN

 

Oscuridad
manchada por la niebla.
Andén helado. 

La luz del tren.
La luz del cigarrillo.
Noche cerrada. 

Aromas grises:
orín, tabaco muerto,
grasa sin sol. 

Luna infinita
sobre la finitude
de la estación. 

La oscuridad
abulta. En su piel,
laca de luna. 

No se oyen pájaros,
sino el zureo gris
de los metales. 

La piel oscura
de la mujer oscura
irradia luz. 

Al levantarse
me han rozado sus pechos
interminables. 

Quietud, chirridos:
el tren se coagula
en la estación. 

Me envuelve, gris,
la hiedra del cansancio.
Pájaros rotos. 

El tren devora
tiempo, que se amontona
en su interior.


Eduardo Moga



Escuridão
manchada por nevoeiro.
Plataforma gelada.

A luz do trem.
A luz do cigarro.
Noite cerrada.

Aromas cinza:
urina, tabaco morto,
gordura sem sol.

Lua infinita
sobre a finitude
da estação.

A escuridão
incha. Na sua pele,
laca de lua.

Não se ouvem pássaros,
mas o arrulho cinza
dos metais.

A pele escura
da mulher escura
irradia luz.

Ao levantar-se
roçou-me os peitos
intermináveis.

Quietude, chiando:
o trem coagula
na estação.

Cobre-me, cinzenta,
a hera do cansaço.
Pássaros estoirados.

O trem devora
tempo, que se amontoa
no interior.

(Trad. A.M.)

 

>>  Vallejo (14p) / Poesia (8p) / Poemas del alma (11p) /  Eduardo Moga (blogue) / Cat. M.Delibes / Wikipedia

.

20.7.25

Manuel Moya (Razão para el-rei D. Sebastião)




RAZÓN PARA EL REY DON SEBASTIÁN 

 

Quien teme a sus sueños es sabio,
y el que escucha la fuente y observa sus peces
y en ellos posa su pequeña vida
para descubrir en sí mismo el hechizo inmaculado
de la quietud y el retoño.
Pero quien rehuye a los sueños prepara ya su muerte,
cada día sube hasta su casa sabiendo que hace tiempo
su casa es un sudario y su rostro en el espejo
el frío rostro de una estatua esculpida en el aire.
Y quizás fueran tus sueños, devastadores, locos,
del todo irrealizables, los que aún retumben en las calles
y den a tu figura el lustre que la vida niega siempre.
La muerte a todos cumple, pero limpios y dorados
son los sueños que nunca se realizan.
Todos en el fondo lo intuimos:
empezamos a morir justo ese día
que decidimos aceptar nuestro fracaso
y horrorizados olvidamos en el campo de batalla
nuestros sueños.
 

Manuel Moya 

 

Quem teme seus sonhos é sábio,
e também o que escuta a fonte e observa seus peixes
e neles pousa sua pequena vida
para descobrir em si mesmo o feitiço imaculado
da quietude e do renovo.
Mas quem evita os sonhos prepara já sua morte,
cada dia entra em casa sabendo que há muito
sua casa é um sudário e seu rosto no espelho
o frio rosto de uma estátua lavrada no ar.
E talvez fossem teus sonhos, loucos, devastadores,
de todo irrealizáveis, os que ainda retumbem na sruas
e dêem a teu perfil o lustro que a vida nega sempre.
A morte a todos cumpre, mas limpos e dourados
são os sonhos que nunca se realizam.
Todos no fundo o intuímos:
começamos a morrer justo no dia
em que decidimos aceitar o nosso fracasso
e como horror esquecemos no campo de batalha
nossos sonhos.


(Trad. A.M.)

.

18.7.25

Raymond Carver (A melhor hora do dia)




THE BEST TIME OF THE DAY  



Cool summer nights.
Windows open.
Lamps burning.
Fruit in the bowl.
And your head on my shoulder.
These the happiest moments in the day.

Next to the early morning hours,
of course. And the time
just before lunch.
And the afternoon, and
early evening hours.
But I do love

these summer nights.
Even more, I think,
than those other times.
The work finished for the day.
And no one who can reach us now.
Or ever.

 

Raymond Carver

[La ceniza]


 

Noites frescas de verão,
janelas abertas,
as luzes acesas,
a fruta no cesto,
e a tua cabeça no meu ombro,
a melhor hora do dia. 

Depois do princípio da manhã,
claro. E da hora
mesmo antes do almoço.
E à tarde também,
a primeira hora da noite.
Mas eu gosto mesmo 

é destas noites de verão.
Mais até, creio eu,
do que das outras horas.
Acabou-se o trabalho por hoje,
e ninguém que nos possa atingir,
agora, ou nunca.
 

(Trad. A.M.)

 .

16.7.25

Miguel Sánchez-Ostiz (Ubi sunt)




UBI SUNT

 

Dónde están, en qué oscuridad,
en qué país, en qué refugio,
qué camino torcido tomaron,
pero no las damas de antaño,
famosas, ni los galanes y los guerreros,
con sus armas abisinias,
sino los cuadrilleros, camaradas de un tiro,
compinches dicharacheros
de ahora mismo, de hace un rato,
y que estaban aquí, lo juro,
en el recuento de las rondas
tumultuosas de noche.
Ni siquiera soplaron las velas,
aterrados por sí mismos en sus noches,
esfumados por arte de birlibirloque.
Ubi sunt?

No, no preguntes, mejor no sepas
ni mañana ni nunca a dónde fueron.

Miguel Sánchez-Ostiz

 

 

Onde é que estão, em que escuro,
em que país,  que refúgio,
que caminho torto tomaram,
mas não as damas de antanho,
famosas, nem os galãs e guerreiros,
com suas armas abissínias,
mas os quadrilheiros, camaradas de tiro,
companheiros correntões
de agora mesmo, de há bocado,
e que estavam aqui, juro,
 na revista das rondas
tumultuosas da noite.
Nem sequer sopraram as velas,
aterrados por si mesmos em suas noites,
esfumados por artes de berlique-berloque.
Ubi sunt?

Não, não perguntes, melhor que não saibas
nem amanhã nem nunca
aonde é que foram.

(Trad. A.M.)

.

15.7.25

Miguel d'Ors (Chuva)



LLUVIA
 

Lluvia que llega
de muy lejos.
Su oscura
llamada en mis cristales,
insistente.
Llueve.
Por las difusas calles
rumorosas me alejo;
me pierdo en otras lluvias
que lentamente caen
en mi pasado: viejas
rúas de piedra y lluvia,
clases de Historia y lluvia,
campanadas de lluvia
sobre mi infancia… Llueve
en mi ventana; aquélla,
esta ventana.
Lluvia,
tibia lluvia que por
el trasfondo del tiempo
acompaña mi vida
poniéndole esta música
gris y lenta…
Esta tarde
la lluvia y yo escribimos
a medias estos versos.
 

Miguel d'Ors

 

Chuva que vem
de muito longe.
Bate insistente,
chamando
nos meus vidros.
Chove.
Por ruas difusas
e rumorosas me afasto;
perco-me em outras chuvas
caindo lentamente
no meu passado: velhas
ruas de pedra e chuva,
aulas de História e chuva,
badaladas de chuva
da minha infância... Chove
na minha janela; esta,
aquela janela.
Chuva,
chuva morna
que do fundo do tempo
acompanha-me a vida
e lhe dá esta música
cinzenta, vagarosa...
Esta tarde
eu e a chuva escrevemos
estes versos a meias.
 

(Trad. A.M.)

 .

13.7.25

Nuno Júdice (O movimento do mundo)




O MOVIMENTO DO MUNDO 

 

Às vezes, um verso transforma o modo como
se olha para o mundo; as coisas revelam-se
naquilo que imaginação alguma a supôs; e
o centro desloca-se de onde estava, desde
a origem, obrigando o pensamento a rodar
noutra direção. O poema, no entanto, não
tem obrigatoriamente de dizer tudo. A sua
essência reside no fragmento de um absoluto
que algum deus levou consigo. Olho para
esse vestígio da totalidade sem ver mais
do que isso - o desperdício da antiga
perfeição - e deixo para trás o caminho
da ideia, a ambição teológica, o sonho do
infinito. De que eternidade me esqueço,
então, no fundo da estrofe?
 

Nuno Júdice

 .

11.7.25

Antonio Gómez (Em menino)



De niño contaba estrellas, 
ovejas antes de dormir,
todos los lunares de mi cuerpo
o los pasos que separaban mi casa del colegio.

Hoy cuento fracasos,
titubeos,
desencuentros
y coartadas a seguir.

Antonio Gómez

 

Em menino  eu contava estrelas,
ou carneiros para dormir,
os sinais todos do corpo
ou os passos de minha casa ao colégio.

Hoje conto fracassos,
titubeios,
desencontros
e desculpas de mau pagador.


(Trad. A.M.)



>>  Voces del extremo (11p) / Voces del extremo (5p)

.

10.7.25

Martín López-Vega (Laranja)





LARANJA

 

 

Alguém a deixou sobre a mesa do jardim, a laranja.

Agora é um símbolo da tarde, essa fruta

brilhando por entre o confuso calor deste fim de dia

luminoso como uma recordação amorosa da adolescência,

como a primeira laranja,

como as mãos que cheiram a laranja.

 

(Rodearam-na logo as formigas, esvoaçaram

em seu torno mil insectos, bailará a noite

em seu redor.) Mas agora essa laranja na tarde

supõe uma ordem, um sentido, o centro gravitacional do dia.



Martín López-Vega

 

(Trad. Ruy Ventura)


.

8.7.25

Louise Glück (Um romance)




A NOVEL

 

No one could write a novel about this family:
too many similar characters. Besides, they’re all women;
there was only one hero.

Now the hero’s dead. Like echoes, the woman last longer;
they’re all no tough for their own good.

From this point on, nothing changes:
there’s no plot without a hero.
In this house, when you say plot what you mean is love story.

The women can´t get moving.
Oh, they get dressed, they eat, they keep up appearance.
But there’s no action, no development of character.

They’re all determined to suppress
criticism of the hero. The problem is
he’s weak; his scenes specify
his function but not his nature.

Maybe that explains why his death wasn’t moving.
First he’s sitting at the head of the table,
where the figurehead is most needed.
Then he’s dying, a few feet away, his wife holding a mirror under his mouth.

Amazing, how they keep busy, these women, the wife and two daughters.
setting the table, clearing the dishes away.
Each heart pierced through with a sword.

 

Louise Glück

[Hector Castilla]

 

 

Com esta família, ninguém fazia um romance,
as personagens são muito parecidas,
além disso são todas mulheres,
haveria um só herói.

O herói está morto, as mulheres duram mais, tal como o eco;
são menos tesas para seu próprio bem.

Daqui para a frente, nada muda, sem herói não há enredo.
Aqui em casa, enredo quer dizer história de amor.

As mulheres não se mexem.
Sim, vestem-se, comem, cuidam do seu aspecto,
mas não há acção, nem evolução da personagem.

Estão empenhadas todas em excluir a crítica do herói,
o problema dele é ser fraco,
as cenas indicam-lhe a função,
mas não a natureza.

Talvez isto explique porque é que a morte dele não foi comovente,
primeiro com ele sentado à cabeceira da mesa,
depois a morrer, a poucos passos,
com a mulher a pôr-lhe um espelho por baixo da boca.

Espantoso, como se afanam estas mulheres,
a mulher e as filhas, a pôr a mesa, a levantar os pratos,
com uma espada a traspassar-lhes os corações.


(Trad. A.M.)

 .

6.7.25

Marta Sanz (A pálpebra)




A pálpebra é 
no fundo
tão fina
que toda a luz 
a trespassa. 

E também o escuro.
 

Marta Sanz 

(Trad. A.M.)

 .

5.7.25

Marta López Vilar (De sombras e sombreiros)



DE SOMBRAS E SOMBREROS OLVIDADOS

 

Aprenderé tus sombras para que no se me olviden
y cuidaré de ti en días como estos
en los que nuestras huellas
sólo son de sombras y sombreros olvidados.

Son los días del olvido.
Nadie puede ser más afortunado que nosotros.
Amémonos si es preciso.

Marta López Vilar

 

Aprenderei tuas sombras para que não me esqueçam
e cuidarei de ti em dias como estes
em que nossos rastos
são só de sombras e chapéus olvidados.

Dias de olvido.
Ninguém mais afortunado que nós.
Amemo-nos, sendo preciso.


(Trad. A.M.)

.

3.7.25

Freire Falcão (Gaivotas)




GAIVOTAS

 

O mar finge
tomar a praia,
submergi-la
para sempre.
Mas não.
Sugere a catástrofe
previsível
e logo desiste. 

Apenas quer
o desenfado
das gaivotas,
que não têm
o que fazer,
quietas,
alinhadas,
viradas para lá;
(esta preguiça,
este sossego,
esta ordem natural
será tédio?)


Freire Falcão

[Triplo V]

 

>>  Triplo V

.

1.7.25

Luis Alberto de Cuenca (Julia)




JULIA 

 

Mientras haya ciudades, iglesias y mercados,
y traidores, y leyes injustas, y banderas;
mientras los ríos sigan vertiendo su basura
en el mar y los vientos soplen en las montañas;
mientras caiga la nieve y los pájaros vuelen,
y el sol salga y se ponga, y los hombres se maten;
mientras alguien regrese, derrotado, a su cuarto
y dibuje en el aire la V de la victoria;
mientras vivan el odio, la amistad y el asombro,
y se rompa la tierra para que crezca el trigo;
mientras tú y yo busquemos el medio de encontrarnos
y nuestro encuentro sea poco más que silencio,
yo te estaré queriendo, vida mía, en la sombra,
mientras mi pecho aliente, mientras mi voz alcance
la estela de tu fuga, mientras la despedida
de este amor se prolongue por las calles del tiempo.
 

Luis Alberto de Cuenca 

 

Enquanto houver cidades, igrejas e mercados,
e traidores, e leis injustas, e bandeiras;
enquanto os rios continuarem a despejar seu lixo
no mar e os ventos soprarem nos montes;
enquanto cair a neve e os pássaros voarem,
e o sol se puser e nascer, e os homens se matarem;
enquanto alguém regressar derrotado a casa
e fizer no ar o V da vitória;
enquanto viverem o ódio, a amizade, o assombro,
e se rasgar a terra para o trigo crescer;
enquanto tu e eu buscarmos o meio de nos encontrar
e nosso encontro for pouco mais que silêncio,
eu hei-de querer-te sempre, vida minha, na sombra,
enquanto meu peito respirar, enquanto minha voz seguir
a esteira da tua fuga, enquanto se prolongar
o adeus deste amor pelas ruas do tempo.
 

(Trad. A.M.)

 .