SABROSA
Canta o cuco nos campos de Sabrosa.
O ar fino vibra como um pandeiro.
O ano vai seco. Tempo é
de soltar os cães nos olhos das raparigas.
António Cabral
SABROSA
Canta o cuco nos campos de Sabrosa.
O ar fino vibra como um pandeiro.
O ano vai seco. Tempo é
de soltar os cães nos olhos das raparigas.
António Cabral
ASÍ PLANCHABA QUE YO
LA VI
Cuántos pantalones
hubo de planchar aquella mujer
para que sus hijos tuvieran unos pantalones
que le dejaban los viernes
en el cesto de la ropa por planchar.
Pareciera que las arrugas
de los pantalones que planchaba
le trepaban por los brazos
y se alojaban para siempre en su rostro.
La muerte la encontró planchando
en el cuartito de la radio,
rociando con agua tibia pantalones ajenos
como una sacerdotisa bendiciendo
las piernas de un ejército invisible.
Y ahí debe de estar todavía,
nadie ha abierto la puerta desde entonces.
Ella no pudo acompañar a la muerte.
Le quedaba aún mucha ropa por planchar.
Pedro Flores
Quantas calças
aquela mulher teve de passar
para os filhos terem calças
que lhe deixavam à sexta
no cesto da roupa a passar.
Parecia que as gelhas
das calças que passava
lhe trepavam pelos braços
e se lhe alojavam no rosto.
A morte veio encontrá-la a passar
no quartito do rádio,
a borrifar calças alheias com água morna
como uma sacerdotisa a benzer
as pernas de um exército invisível.
E lá deve estar ainda,
ninguém abriu aquela porta desde então.
Ela não pôde acompanhar a morte,
ainda tinha muita roupa para passar.
(Trad. A.M.)
Se vive
con la esperanza de llegar
a ser un recuerdo.
NO MOON, BUT
I Knew it was
the beekeeper
who touched me,
not because she
tasted of honey,
but because she
was unafraid
of being stung.
Andrea Cohen
Soube que fora
a apicultora
que me tocara,
não porque ela
soubesse a mel,
mas porque
não tivera medo
de ser picada.
(Trad. FJCC)
Siento el crepúsculo en mis manos.
Llega a través del laurel enfermo.
Yo no quiero pensar ni ser amado
ni ser feliz ni recordar.
Sólo quiero sentir esta luz en mis manos
y desconocer todos los rostros
y que las canciones dejen de pesar en mi corazón
y que los pájaros pasen ante mis ojos
y yo no advierta que se han ido.
Hay grietas y sombras en paredes blancas
y pronto habrá más grietas y más sombras
y finalmente no habrá paredes blancas.
Es la vejez.
Fluye en mis venas como agua atravesada por gemidos. Van
a cesar todas las preguntas. Un sol tardío
pesa en mis manos
inmóviles y a mi quietud
vienen a la vez suavemente, como una sola sustancia,
el pensamiento y su desaparición.
Es la agonía y la serenidad.
Quizá soy transparente y ya estoy solo sin saberlo.
En cualquier caso, ya
la única sabiduría es el olvido.
Antonio Gamoneda
Sinto
o crepúsculo nas mãos,
chegando
através do cravo doente.
E
eu não quero pensar, nem ser amado,
nem
ser feliz, nem recordar.
Quero
só sentir esta luz nas mãos
e
desconhecer os rostos
e
que as canções deixem de pesar-me no coração
e
os pássaros me passem diante dos olhos
sem
eu dar conta de que se foram.
Há
fendas e sombras nas paredes brancas
e
breve haverá mais sombras e fendas
até
deixar de haver paredes brancas.
É
a velhice.
Corre-me
nas veias como água
atravessada
por gemidos.
Cessarão
as perguntas todas. Um sol tardio
pesa-me
nas mãos imóveis, enquanto
o
pensamento e a sua negação invadem,
à
uma, a minha quietude.
É
a agonia e a serenidade.
Sou
talvez transparente e já estou só, sem saber.
Em
qualquer caso, há uma só sabedoria,
a
do esquecimento.
(Trad.
A.M.)
.
(48)
Viver
pior
Sofrer
mais
Dizê-lo
Não
dizer
ANTONIO
FERNÁNDEZ LERA
Poemas
lentos
(2012-18)
(Trad.
A. M.)
.
FACA
Vou
constituir-te arguida
pelo
assassinato dos meus sonhos.
O êxtase
consentia-te
juras de
amor, mas a verdade
é que o
amor é coisa ilimitada
e tu
premeditavas dar-me
ao
abandono, mais dia
menos
dia. Aberta uma romã
o mais
que se consente
é usufruir dos brilhos que ela dá
e agradecer ao templo escarlate
em que
nos foi permitido entrar.
E não
este desgosto, esta faca malsã
que
marca a tua ausência na minha pele.
Amadeu
Baptista