Também o mestre Libório sofria pela calada.
Não só devido ao seu descosimento intestinal, mas também por causa da mulher.
A Maria Santa fazia-lhe a vida negra.
Em casa era o mestre Libório um cordeirinho.
Amante como ninguém de festas e procissões, precisava, no entanto, utilizar de manha e cautela se acaso queria ir assistir a alguma.
E que a mulher só se encontrava consigo contradizendo. Dela é que devia partir a iniciativa. Ficar por baixo é que nunca, a não ser...
Depressa o mestre Libório lhe deu com o jeito: virava do avesso a casaca das palavras, e tudo batia certo.
Se sentia um desejo por algum prato mais apetitoso, chegava à beira da Santa e desabafava:
Sabes, mulher, ao vir para casa, vi os pedreiros das obras do senhor Esmeraldo comendo chouriço cozido com ovos e pão trigo; até me senti embrulhado; há lá nada que chegue aos charrinhos assados na sertã, com molho de vilão e pão de rala!...
Escutava-o a Santa, calada, mas depois não se continha e explodia:
Pois vais também comer o mesmo, para aprenderes a não ser biqueiro.
- CRISTÓVÃO DE AGUIAR, O fruto e o sonho, 2.ª parte, cap. VI, abertura, da trilogia Raiz Comovida.
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