10.8.06
Al Berto (Ofício de amar)
OFÍCIO DE AMAR
já não necessito de ti
tenho a companhia nocturna dos animais e a peste
tenho o grão doente das cidades erguidas no princípio doutras galáxias, e o remorso
um dia pressenti a música estelar das pedras, abandonei-me ao silêncio
é lentíssimo este amor progredindo com o bater do coração
não, não preciso mais de mim
possuo a doença dos espaços incomensuráveis
e os secretos poços dos nómadas
ascendo ao conhecimento pleno do meu deserto
deixei de estar disponível, perdoa-me
se cultivo regularmente a saudade do meu próprio corpo
Al Berto
BIOGRAFIA
Nasceu em Coimbra a 11 de Janeiro de 1948 e morreu em Lisboa, a 13 de Junho de 1997. Poeta e editor. De seu verdadeiro nome Alberto Raposo Pidwell Tavares, começou a publicar poesia no final da década de 70 (À Procura do Vento num Jardim d'Agosto, 1977), sendo actualmente considerado um dos mais importantes poetas da sua geração e um dos mais originais, possuidor de um universo de características muito próprias no panorama da poesia portuguesa da actualidade. De facto, cultivando uma poesia fortemente lírica e de pendor confessional, como aliás é patente no título, de 1985, Uma Existência de Papel, Al Berto tem vindo a construir um universo poético que foi já considerado "um dos mais melancólicos da nossa poesia recente" por Fernando Pinto do Amaral.
Espelhando vivências de uma juventude errante, em deambulações por uma certa Europa marginal e underground - que o poeta cumpriu vivendo, entre o final da década de sessenta e a década de 70, numa comunidade urbana de Bruxelas e nos bas-fonds de Paris e Barcelona -oscilando entre o excesso da experiência emocional e física e uma melancolia desolada e solitária, a obra de Al Berto reflecte a presença imaginária de Genet e Rimbaud na paixão urgente e dolorosa, na transgressão sexual, na vertigem auto destrutiva, na solidão, na experiência do deserto e da morte.
Ao situar o seu discurso poético a meio caminho entre a extrema lucidez e a ternura, a exposição narcísica e a assunção da literatura como ficção inseparável da vivência, Al Berto tem sido considerado, na tonalidade crepuscular que envolve toda a sua obra, uma voz "entre a subjectividade romântica e a impessoalidade modernista" (Hélder Moura Pereira), num território já pertencente ao domínio da pós-modernidade.
Fonte (Biografia)
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