17.9.25

Ana Montojo Micó (Desalento)

 




DESALIENTO
 

 

Qué te voy a decir que tú no sepas,
si ya está todo dicho,
cómo voy a inventar otras palabras
para nombrar de nuevo lo de siempre,
cómo voy a escribir siquiera un verso
que te hable de amor sin repetir
esas cosas tan dulces que dicen los amantes,
cómo te voy a hablar del frío de mi piel,
que te invoca aterida entre las sábanas,
sin que me salga un pésimo poema.
Compréndeme, no tengo
ya nada original que pueda enamorarte.
Quizá solo podría ofrecerte un cigarro
y relatarte algunos despropósitos
y una vida cansada
que me ha traído a este desaliento.
Sin embargo yo sé que podría quererte
solo con que escucharas
todas las penas que te cuento a solas
sin que tú te imagines
que duermes a mi lado algunas noches.
Sin embargo yo sé que podrías quererme
solo con que miraras más dentro de mis ojos,
más dentro de la risa, más dentro del abrazo
y vieras la ternura que a veces se me escapa
como se escapa el agua de una cesta.
Sin embargo yo sé que nunca lo sabremos.
 

Ana Montojo 

 

Que te hei-de dizer que tu não saibas,
se está já tudo dito,
como hei-de inventar outras palavras
para nomear de novo o de sempre,
como hei-de escrever  um verso sequer
que te fale de amor sem repetir
aquelas coisas tão doces que os amantes dizem,
como te hei-de falar do frio da minha pele,
que te invoca gelada entre os lençóis,
sem me sair um péssimo poema.
Entende-me, não tenho
já nada original que possa apaixonar-te,
talvez pudesse apenas dar-te um cigarro
e contar-te alguns despropósitos
e uma vida cansada
que me trouxe a este desalento.
E não obstante eu sei que poderia amar-te
só com que escutasses
todas as penas que conto a sós
sem tu imaginares
que algumas noites dormes a meu lado.
E não obstante eu sei que poderias amar-me
só com que olhasses mais dentro dos meus olhos,
mais dentro do riso, mais dentro do abraço
e visses a ternura que às vezes me foge
como foge a água de uma cesta.
E não obstante eu sei que nunca o saberemos.
 

(Trad. A.M.)


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16.9.25

Álvaro Valverde (A modo de poética)




A MODO DE POÉTICA 

 

Como el agua,
que limpia se detiene en esas balsas
formadas por las hojas cuando obstruyen
el frágil discurrir de la corriente. 

Como el agua,
que pasa y que no vuelve sobre un cauce
de arenas y guijarros. 

Como el agua,
que, toda claridad, es espejismo
que revela cercano lo distante.  

Como el agua,
que la mano atraviesa confiada 
y nunca, sin embargo, toca fondo. 

Como el agua, metáfora y verdad.
Sí, como el agua.
 

Álvaro Valverde

 

Como água,
que limpa se detém nessas balsas
formadas pelas folhas quando entopem
o fraco curso da corrente. 

Como água,
que é miragem, toda claridade,
revelando próximo o distante. 

Como água,
que a mão penetra, confiada,
e nunca todavia toca fundo. 

Como água, verdade e metáfora,
sim, como água.
 

(Trad. A.M.)

 .

14.9.25

Ibne Amar (A amada)






A AMADA

 

Ela é uma frágil gazela:
olhares de narciso
acenos de açucena
sorriso de margarida.
E os seus brincos se agitam
quedam-se os braceletes na escuta
da música do requebro da cintura.
Bom é que não esqueçais
que o que dá ao amor rara qualidade
é a sua timidez envergonhada.
Entregai-vos ao travo doce das delícias
que filhas são dos seus tormentos.
Porém, não busqueis poder no amor…
Que só quem da sua lei se sente escravo
pode considerar-se realmente livre.

Ibne Amar

[Estudio Raposa]

 .

12.9.25

Blas de Otero (Connosco)





CONNOSCO
 

               (Glorieta de Bilbao)

 

Neste café 
sentava-se Don Antonio 
Machado.
                 Silencioso
e misterioso, juntou-se
ao povo,
brandiu a pluma,
sacudiu
a cinza,
e foi-se…
 

Blas de Otero 

(Trad. A.M.)

 .

11.9.25

Roberto Malatesta (Poema nacional)




POEMA NACIONAL



Domingo al mediodía
la carne llega al punto lentamente.
No mucho más que hacer,
mejor no pensar en mañana,
lo porvenir nos cansa
y hemos de abandonar
esa patética costumbre
de vivir en pretérito.
Mejor será esparcir con cuidado la brasa,
no sea que el presente se nos queme.
Felicidad, si es que eso existe,
conjuga sólo en este ahora,
chirría como carne asada,
y nosotros, sagrada argentina familia,

hemos de resolverlo hincando el diente.


Roberto D. Malatesta



Domingo ao meio-dia
a carne fica no ponto lentamente.
Não há muito mais que fazer,
melhor não pensar em amanhã,
cansa-nos o porvir
e temos de deixar
esse costume patético
de viver no passado.
Melhor será espalhar a brasa com cuidado,
não se nos queime o presente.
Felicidade, se é que existe,
rima só com este agora,
chia como a carne assada,
e nós cá, sagrada argentina família,

temos de arrumá-lo ferrando o dente.


(Trad. A.M.)

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9.9.25

António de Almeida Mattos (Do sol se chega)




Do sol se chega
ao nada 

tão vibrante a luz
que se estilhaça 

e fere e por momentos
quedam os olhos cegos,
vazio o pensamento. 

É como foi o ver-te.

 

António de Almeida Mattos

[Arpose]

 .

7.9.25

Antonio Gómez (Não me vão)




No me gustan
los adjetivos calificativos,
los caminos indefinidos,
las banderas arriadas,
las campanas del sistema,
el color rojo sangre,
los golpes programados,
la rutina, las cenizas.    

No me gusta 
la retórica que amplifica 
el eco del silencio, 
la que multiplica vuelos 
símbolos y nortes.

No me gustan los milagros.


Antonio Gómez



Não me vão
os adjectivos qualificativos,
os caminhos indefinidos,
as bandeiras arriadas,
as campainhas do sistema,
a cor do vermelho sangue,
os golpes programados,
a rotina, as cinzas.

Não me vai
a retórica que amplifica
o eco do silêncio,
a que multiplica voos
símbolos e nortes.

Não me vão os milagres.


(Trad. A.M.)

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