25.6.07

Julio Cortázar (Bolero)





.
.
.
.
BOLERO






Que vaidade imaginar
que posso dar-te tudo, amor e fortuna,
itinerários, música, brinquedos.
É verdade que sim:
dou-te tudo que é meu, é verdade,
mas isso tudo que é meu não te basta
como a mim não me basta que me dês
tudo que é teu.



Por isso nunca seremos
o casal perfeito, o bilhete postal,
se não formos capazes de aceitar
que só na aritmética
o dois nasce de um mais um.



Um papelito por aí
diz simplesmente:
Foste sempre o meu espelho,
quer dizer, para me ver tinha que olhar-te.



E este fragmento:
A lenta máquina do desamor
a engrenagem do refluxo
os corpos que deixam as almofadas
os lençóis os beijos




e de pé frente ao espelho interrogando-se
cada um a si mesmo
já não olhando-se entre si
não já nus para o outro
não já te amo,
meu amor



Júlio Cortázar


(Trad. A.M.)


Original: Prosa Caótica



Fontes: Sitio Oficial (vida+obras+fotos+voz+linques) / Outro (idem/aspas) / EPDLP (bio+textos+fotos) / Los Poetas (bio+14p) /Portal de Poesia (21p) / A-media-voz (32p)

.